segunda-feira, 3 de dezembro de 2012

Vilarejo das Andorinhas


Vilarejo das Andorinhas
Wesley Faria


Pra quem gosta de um bom historiado aqui vai um bem contado,
Tem de tudo que se pode imaginar, tem memorias recém chegadas de
algum lugar, tem o cheiro de café no bule a passar, tem a renda do vestido
que se balança no ar, tem até moça praieira num lugarejo bem pequeno beira mar.

A história que você vai ler é um pouco inventada,
um pouco colorida, um pouco verdadeira,
Mas aquilo que inventaram não se podia inventar,
sem ter algo que já existia pra poder se utilizar.
Logo, todo invento tem verdade em seu intento.

Pois bem, vilarejo que se preze tem que ter uma igreja,
Uma praça bem formosa, moças lindas bem vistosas,
com vestidos de fulô, tem que ter velhinhas lentas,
esperando nas janelas, tem que ter também doutor,
que pra dar bom dia pra elas.

Nesse vilarejo tinha, muita rosa, muita flor,
Muita moça, muito moço, tinha até o tal doutor,
Que andava meio fraque, espiando pelos cantos,
Um que estava pelos prantos que até parecia derreter,
Era tanta água salgada, que a queijaria se perdia
sem saber que logo ali havia uma fábrica de salmora,
Logo ali, nos olhos de um matuto, que só falava em soluço,
E de tanto balbucear, esqueceu sua lingua natal,
Soluçava um choro frouxo, atrapalhava a missa e o cortejo
No salão paroquial por conta de um beijo que sua amada lhe negou,
E disse "não leve a mal, é que achei um outro rapaz".

O pobrezinho chorava, coçava e chorava mais,
Dava pena de ver o moço, passando pelas janelas,
As velhinhas nem davam trela, umas  não viam ninguém.
Outras já nem ouviam tão bem, quando o moço passava aos prantos,
As moças corriam tanto que o moço ficava só,
Mas um sabido doutor, que pra rimar, chamei de Nicanor,
O chamou e perguntou:

- Rapaz formoso que chora ao vento, à quem dedica este lamento?

E o rapaz molhado com sua salmora soluçou ao bom doutor,

- Eu SNIFF, choro, SNIFF, por conta, SNIFF, de um amor

O doutor em sua sapiencia, explanou ao jovem molhadelo:

- Meu nobre jovem molhado, se perceber sou descasado,
deveras amargurado, porém não se pode retroceder,
vejo que passas todos os dias sem querer ao menos viver,
Pense bem nos seus momentos, pense e lembre do que passou,
de certo se lhe negaram o beijo, era porque não havia amor,
se amor outrora houvesse não seria extirpado, esse beijo que
agora padece. Erga os olhos e veja os pássaros, vê ali?
Um casal de andorinhas, bem ali na sacadinha, olha como são lindinhas,
Viu as asas tão branquinhas, salpicadas com manchinhas?
são tão belas e parceiras, sempre voam a tardinha.

Mas perceba que são parceiras, são amigas verdadeiras,
porém não precisam de beijos, de abraços ou festeijos,
São o que são e pronto, não precisam dizer ao mundo,
não precisam velar defunto só para dizer "estamos juntos"

Então perceba e pode se enxugar, o seu amor verdadeiro está
Dentro do teu coração, você precisa é se dar a mão e parar
de negar beijo pra quem espera em solidão,
Entenda que quando uma lágrima cai,
ela lhe tapa a visão.


Neste momento o chorão, digo, o homem em desilusão,
Olhou pra cima da casa, bem pertinho da sacada,
Haviam duas andorinhas, com carinhas apaixonadas,
As lágrimas neste momento não representavam quase nada.
Ele agradece ao sábio doutor com uma grande gargalhada,
Vai pra casa bem depressa e fica lá a tarde inteira,
Parecia que a vilazinha iria ser coroada,
com uma notícia iluminada,
Iria sorrir denovo, o homem que só chorava.

As horas se passavam e a tarde ia caindo,
Como as andorinhas se ajuntavam na sacada de uma velhinha,
O jovem ex-chorador apareceu bem na frente de Nicanor
Feito um trem a vapor, em uma mão um lenço branco,
Na outra uma espingarda, ele parou, empunhou o trabuco
e com uma cara de maluco apontou para a sacadinha,
Uma velhinha gritou

"seu mooooço, faça isso nããão"

E ele respondeu sorrindo,

- Agora aprendi a lição, quando uma andorinha ama, ela não precisa mostrar,
Mas fica tudo ai com cara de besta, sorrindo pra quem quer chorar,
Ficam aí bancando as sábias, enganaram até Nicanor, pobrezinho daquele doutor, aperreado das idéia.
Eu vou é acabar com tudo, andorinha, florzinha e sacada,
Que é pra eu chorar o quanto quiser, com saudades da minha amada,
Pois lição de amor não existe, não se pode ser explicada,
Pois só é lição pra quem vive, quem está de fora não entende nada.


Ele pegou a espingarda e apontou pra o céu, disparou tres vezes,
até que as andorinhas voaram depressa dali,
Nunca mais foram vistas, existem igual ao saci,
que a gente sabe que existe, mas não encontra jamais,
Quem sabe as andorinhas estão na sacada de outros quintais.


Bom, a história acaba assim, afinal fui eu quem a escrevi,
Então se o sono aperreia, coloco um ponto e vou dormir,
Mas acho que ainda dá tempo de explicar o que o moço fez,

Não se pode dizer ao outro que sua dor é pequena demais,
Não se pode encontrar exemplos pra explicar o que a vida faz,
A dor de amor é um livro de autoajuda, mas como todo livro de autoajuda,
Só faz sentido pra quem lê. Assim é a dor do amor, que é feita pra ensinar, que dá pesos pra quem quer voar, só faz sentido pra quem quer sentir e só quem a sentiu um dia meu amigo, é que pode ensinar.


Esse vilarejo existe, essas andorinhas também,
Acho que inventei o resto, espero que não irrite ninguém.

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